Transformar a ambição em prática:
Implementação de uma diligência devida efectiva no Fórum da OCDE
Blogpost, 26 de fevereiro de 2024
Esta semana, os líderes do sector reuniram-se para o Fórum da OCDE sobre a devida diligência no sector do vestuário e do calçado para influenciar a definição da agenda em tópicos críticos, incluindo acordos vinculativos entre empresas e sindicatos, adaptação climática, salários dignos, o papel dos retalhistas na promoção de cadeias de fornecimento responsáveis, certificações e mecanismos de reclamação. A linha comum ao longo do Fórum foi uma profunda compreensão da urgência de forjar um futuro em que a diligência devida não seja apenas uma recomendação ou requisito, mas uma parte intrínseca da forma como os actores da indústria operam, tanto de forma independente como em colaboração. Isto tem de ser feito com o envolvimento e a integração consistentes das perspectivas e realidades vividas pelos trabalhadores.
Acordos vinculativos entre empresas e sindicatos: Um caminho para a justiça e a confiança
O foco na colaboração das partes interessadas deu o mote para a sessão "Acordos vinculativos entre empresas e sindicatos e o seu papel na diligência devida". O Dr. Bärbel Kofler, do Ministério Federal da Cooperação Económica e do Desenvolvimento (BMZ), salientou a forma como um quadro jurídico obrigatório promove a colaboração entre marcas, sindicatos e ONG através de um envolvimento significativo das partes interessadas. Esta colaboração tem como objetivo desenvolver e implementar soluções práticas, beneficiando, em última análise, os trabalhadores no terreno. Atle Høie, da IndustriALL Global Union, sublinhou a importância de respeitar a liberdade de associação como um direito fundamental nos acordos vinculativos, destacando o seu papel na criação de confiança entre empresas e sindicatos. Ken Loo, da Textile, Apparel, Footwear & Travel Goods Association, fez eco deste sentimento, defendendo uma proteção justa de todas as partes envolvidas no cumprimento do contrato. " Temos de incutir confiança e baseá-la num sistema em que ambas as partes se possam apoiar [em acordos escritos]", defendeu Loo. Em contextos de falta de confiança, os acordos juridicamente vinculativos podem servir de solução para promover interacções justas e responsáveis.
Enfrentar os desafios da adaptação às alterações climáticas
Da esquerda para a direita: Joy Roeterdink (Suitsupply), Tamar Hoek (Solidaridad), Laila Petrie (2050), Sophie Lavaud (OCDE), Jason Judd (Universidade de Cornell)
A conversa alargou-se e o foco passou a ser a abordagem dos desafios das alterações climáticas através da devida diligência. Jason Judd, da Universidade de Cornell, delineou os riscos sociais e de saúde interligados colocados pelas alterações climáticas, incluindo o calor extremo, as inundações, a escassez de água, a segurança dos trabalhadores e os desafios da continuidade das actividades. Kalpona Akter, do BCWS, sublinhou o impacto desproporcionado e de género destes desafios nas mulheres trabalhadoras, especialmente quando as responsabilidades domésticas se cruzam com as perturbações relacionadas com o clima. Sublinhou a incoerência entre cuidar das mulheres trabalhadoras nas fábricas e negligenciar o seu bem-estar no espaço privado do agregado familiar, defendendo abordagens sistémicas à diligência social que abordem questões sociais mais amplas. Akter continuou a reiterar a necessidade de envolver várias partes interessadas, incluindo sindicatos, organizações da sociedade civil, ONG e fábricas, nos debates sobre a adaptação, sublinhando a necessidade de políticas de adaptação tanto a nível nacional como das fábricas: "Exigimos que as nossas vozes estejam no centro da mesa porque somos os mais afectados".
Em busca de salários dignos: Estratégias de ação
Na sessão 'Brand due diligence strategies in living wages: adapting action to context', Fiona Dragstra, da WageIndicator Foundation, destacou a questão predominante das empresas que não cumprem os requisitos de salário mínimo, quanto mais garantir salários dignos. Este facto está em consonância com os dados da métrica salarial 2024 da The Industry We Want, que revela uma diferença média de 49,5% entre os salários mínimos e as estimativas do salário de subsistência em 28 países produtores de vestuário. Prathihka Kurian, da SanMar, sublinhou a ligação entre os salários e as práticas de compra responsáveis, bem como a importância de uma abordagem de parceria entre as empresas e as fábricas, salientando a importância de compreender as operações das fábricas no âmbito de uma relação mutuamente benéfica e de longo prazo. Filip Stefanovic, do TUAC, fez eco deste sentimento, sublinhando a necessidade crucial de capacitação dos trabalhadores e de um diálogo social equitativo para impulsionar aumentos salariais e mudanças sistémicas significativas.
Da esquerda para a direita: Ilishio Lovejoy (Simple Approach), Prathika Kurian (SanMar), Peter McAllister (ETI), Filip Stefanovic (TUAC), Fiona Dragstra (WageIndicator)
Os retalhistas como agentes de mudança nas cadeias de abastecimento responsáveis
O imperativo de colaboração continuou a infiltrar-se na sessão "O papel dos retalhistas na construção de cadeias de abastecimento responsáveis". O painel de discussão reforçou a importância da transparência, normalização e colaboração para a melhoria contínua entre compradores e retalhistas, juntamente com o papel da regulamentação na criação de condições equitativas. Christian Smith, da Zalando, afirmou que "para os retalhistas, a criação de impacto resulta de aproveitarmos a oportunidade para identificar os nossos pontos de alavancagem, juntamente com a capacidade das marcas, e de procurarmos soluções em conjunto, de forma colaborativa". Um dos principais desafios que os retalhistas enfrentam é ganhar transparência nas cadeias de abastecimento dos seus parceiros e exercer uma influência significativa sobre as suas estratégias operacionais e comerciais. Por exemplo, a resolução de questões relacionadas com as Práticas de Compra Responsáveis (PPR), tais como a necessidade de alterar as condições de pagamento aos fornecedores, representa um desafio complexo para os retalhistas devido à natureza indireta da sua influência. O debate continuou a sublinhar que os retalhistas possuem uma posição única para impulsionar mudanças positivas, criando incentivos eficazes que encorajam os seus parceiros comerciais a adotar e a manter as melhores práticas de Conduta Empresarial Responsável (RBC). Andrew Martin, Vice-Presidente Executivo da Cascale e Representante Executivo da The Industry We Want, comparou a legislação para o sector a um trampolim e não apenas a uma ferramenta de conformidade, salientando o seu papel na facilitação de uma melhoria genuína e da transformação da indústria.
O papel das certificações na diligência devida
Da esquerda para a direita: Andrea Schill (OCDE), Rebecka Sancho (G-Star RAW), Nikhil Hirdaramani (Grupo Hirdaramani), Sheela Ahluwalia (Transparentem), Anant Ahuja (Shahi Exports)
A sessão de abertura do segundo dia, intitulada "Mais do que apenas papelada? O papel das certificações no processo de diligência devida", abordou a importância das certificações nos processos de diligência devida. Sheela Ahluwalia, da Transparentem, insistiu na necessidade de mudanças estruturais, salientando que as empresas devem garantir a liberdade de associação e a representação legítima dos trabalhadores, uma vez que "sem estas componentes fundamentais, as auditorias não poderão descobrir a verdade". Anant Ahuja, da Shahi Exports Pvt Ltd, reflectiu a perspetiva de Ahluwalia, salientando que as auditorias oferecem apenas uma imagem instantânea de uma situação momentânea. Sublinhou que um processo robusto de diligência devida requer avaliações contínuas e a extração de conhecimentos para identificar, mitigar e prevenir riscos de forma eficaz. O painel concordou coletivamente que as auditorias devem ser melhoradas através de uma abordagem de responsabilidade partilhada de normalização, transparência, responsabilidade e regulamentação para maximizar a agência do trabalhador e reduzir o engano.
Acesso à reparação: Garantir a proteção dos trabalhadores
A sessão "A quem recorrer? Explorando o acesso dos trabalhadores às vias de recurso através dos mecanismos de reclamação" abordou as experiências dos trabalhadores no acesso às vias de recurso quando apresentam queixas ao abrigo dos diferentes mecanismos de reclamação que operam no sector. Houve um consenso geral de que a acessibilidade é fundamental: os trabalhadores e os titulares de direitos devem ser informados da existência do mecanismo de reclamação e devem poder utilizá-lo facilmente. Liselotte Goemans, da Fair Wear Foundation, salientou que uma forma de o fazer é confiar nas equipas locais, que desempenham um papel vital na facilitação de uma comunicação e de queixas eficazes, falando as línguas locais, garantindo assim que os trabalhadores se possam exprimir e apresentar queixas numa língua com a qual se sintam confortáveis.
Da esquerda para a direita: Maria Xernou (OCDE), Kirstine Drew (Acordo Internacional), Markéta Svobodová (Ministério da Indústria e do Comércio, República Checa), Liselotte Goemans (Fair Wear), Annabell Brüggemann (Centro Europeu para os Direitos Constitucionais e Humanos)
Goemans sublinhou a necessidade de um acesso efetivo às vias de recurso, reconhecendo os desafios colocados por numerosos sistemas paralelos que podem confundir e dificultar os trabalhadores. Defendendo a colaboração e a integração entre os mecanismos existentes, sublinhou a importância de centrar as perspectivas e as reacções dos trabalhadores para determinar as soluções aceitáveis. Além disso, Goemans sublinhou a integração dos mecanismos de reclamação e do acesso a soluções numa abordagem abrangente de diligência devida em matéria de direitos humanos (DDHH). Ao alinharem mecanismos, auditorias e avaliações num sistema unificado, as empresas podem melhorar a gestão de riscos nas suas cadeias de abastecimento, promovendo, em última análise, resultados mais eficazes para os trabalhadores.
Modelação e manutenção de uma diligência devida eficaz
Ao concluirmos este Fórum, é evidente que o momento de agir é agora. A Diretiva da UE relativa à diligência devida em matéria de sustentabilidade das empresas (CSDDD) representa um passo crucial para consagrar estes princípios na lei. Torna-se inequivocamente claro que o envolvimento das vozes dos países produtores, a promoção da colaboração e a garantia da transparência são fundamentais para concretizar a transformação do sector. Temos o ímpeto para nos impulsionar para um futuro em que a diligência devida transcende a aspiração, tornando-se uma realidade concreta intrinsecamente tecida no tecido das nossas cadeias de abastecimento globais.